3 de maio de 2024
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DOM MÁRIO ZANETTA: O BISPO COMUNICADOR

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dom mário zanetta

Debruçar sobre a vida de Mário Zanetta é fascinante. Não o conheci pessoalmente, tenho apenas uma pequena lembrança de vê-lo longe em uma celebração em minha comunidade de origem. Ouvir testemunhos, ler sobre sua história, escutar suas mensagens por meio dos áudios gravados é no mínimo encantador. Missionário, natural da Diocese de Novara na Itália, chegou ao Brasil em abril de 1969, junto com seu companheiro de missão Padre Lourenço Tori. Desembarcando no Rio de janeiro, os dois padres são destinados à Diocese do Senhor do Bonfim, Estado da Bahia, especificamente na área pastoral da futura Diocese de Paulo Afonso, onde ele seria seu terceiro Bispo (1988 a 1998). Viveu o que a palavra de Deus chama de “Kenosis”, o abaixa-se. Ambos encarnaram no chão seco do sertão a vida missionária no meio do povo. Dentre os tantos legados deixados por Dom Mário, um sobressai: a comunicação. Em fevereiro de 1973, Padre Lourenço, seu irmão de missão, falece em um acidente: sua moto choca-se com uma das caçambas da construção das obras da Chesf, na escavação do Canal da PA IV; recorda-se uma fala de Dom Mário, por esta ocasião: “agora preciso trabalhar por dois”. E assim ele o fez.

Suas mensagens eram claras, diretas, objetivas, com exemplificação do cotidiano das pessoas, característica de um grande comunicador, pois falava do coração ao coração. Recordo uma mensagem onde ele falava em “seja ponte, não seja abismo”, comparando que deveríamos ser ponte como a ponte metálica que que liga as duas paredes do grande cânion do Rio São Francisco:

Irmão querido, eu não sei se você já parou na beira do cânion do São Francisco, senta de um lado, olha pro outro e acha impossível passar, o abismo dá medo, o abismo engole, o abismo amedronta. Quando lhe digo seja ponte, eu imagino aquela ponte metálica que junta e que une Bahia e Alagoas. Eu imagino como seria bonito sermos por cima do abismo do pecado, da divisão, da intriga e do ódio, nós soubéssemos lançar a ponte da amizade, da solidariedade, da fraternidade, a ponte que junta os estremos, a ponte que nossa vida deveria ser. (Áudio de Dom Mário Zanetta).

Ser comunicação é criar pontes entre as pessoas, as instituições e as diversas representatividades que compõem a sociedade. Pouco não foi o esforço de Dom Mário desejar ser comunicação e comunicar, ser ponte. Em 16 de dezembro de 1992 dá início aos trabalhos com a Gráfica Fonte Viva, fruto também do campo gráfico vicentino que já existia. Ele faz questão de estar presente, de conseguir máquinas oriundas da Alemanha. Em uma região periférica do Estado da Bahia, Paulo Afonso, era a única cidade na região que tinha maquinário gráfico para produzir livros revistas em offset, por muitos anos prestou serviço ao Regional Nordeste 3 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), publicando os subsídios da Quaresma Mês da Bíblia, Novena de Natal e da Catequese, chegava a imprimir mais de 100 mil exemplares. É muito conhecido o livrinho “Amigos de Jesus”, subsídio catequético, onde muitas crianças, hoje adultos, vivenciaram a catequese a partir deste subsídio. Funcionários da gráfica relatam que Dom Mário fazia questão de conhecer o funcionamento das máquinas e o acompanhava até altas horas e sempre chegava lá de surpresa.

Sua visão em comunicação era ampla, ele desejou chegar até os rincões mais distantes da Diocese, adquirindo emissoras de rádio, por exemplo, em Cícero Dantas com a Rádio Regional, indo ao ar em 24 de abril de 1990; em Jeremoabo, com a Rádio Vaza-Barris, que iniciou seus trabalhos em junho de 1993, com o apoio do Monsenhor Francisco, Pároco daquela Paróquia. Contratava bons profissionais, mas, sobretudo, pessoas nativas para que profissionalizando-se atuassem através destes meios. Dom Mário investia na pessoa do leigo e leiga, dava oportunidade e acreditava no potencial de cada um. Ainda em relação à radiodifusão, entre os anos de 1996 a 2000, incentivou e apoiou rádios comunitárias, Pe. Ramos Neve instalou na Catedral Nossa Senhora de Fátima, depois em Banzaê, na Paróquia Nossa Senhora da Conceição, e Pe. Wilson Andrade na Paróquia Sagrada Família, ambas em Paulo Afonso. Pe. João Ferreira em Coronel João Sá, Paróquia dedicada a Santo Antônio, Pe. Lívio Piccolin na Quixaba, Glória, Bahia, e Pe. José Francisco Teles em Santa Brígida. Estas últimas não procederam por questões de regularização. Dom Mário desejava que o eco da palavra de Deus ressoasse no Sertão Baiano em toda a Diocese.

Outra iniciativa foi a livraria São Francisco de Assis, no centro de Paulo Afonso, tendo suas atividades iniciadas em 10 de março de 1992, iniciativa do Pe. Pier Antônio Miglio, depois de criada a Fundação Aloysio Penna (FAP) e uniram as instituições: livraria, gráfica, etc. A livraria São Francisco foi um lugar de difusão de bíblias, livros, subsídios para as comunidades, imagens e artigos religiosos. Foi um período áureo na comunicação eclesial diocesana.

Voltando a Paulo Afonso, Dom Mário tem a iniciativa de criar a TV Fonte Viva, isso a partir de 27 de março 1998, produtora de vídeo de conteúdos para as comunidades, que na época tornou-se referência inclusive para TV Bahia que enviava os seus profissionais para serem capacitados na TV Fonte Viva por conta dos equipamentos modernos e atuais. Dom Mário desejava que a TV Fonte Viva fosse uma TV educativa, os trabalhos da TV chegaram ao fim em junho de 2016.

Não bastante a isso, é inaugurado em 13 de novembro de 2000, dois anos após a morte de Dom Mário, o Instituto Tecnológico Mário Zanetta, o Instec, voltados para cursos profissionalizantes de rádio, fotografia, vídeo, edição, diagramação e informática e manutenção de micro entre outros. Os alunos recebiam apostilas gratuitamente e a inscrição era por processo seletivo. As aulas deram início em 12 de março de 2001. Era uma “escola de comunicação” em Paulo Afonso, idealizado o projeto, para que o Instec funcionasse, quem o concretizou foi o Pe. Ricardo Guerrino Brusati, italiano, que se tornou 8º Bispo da Diocese de Caetité, Bahia. O Instec parou de atuar em 2010, por falta de recursos para sua manutenção. Sendo o Instec o “perfume” de Dom Mário.

Como não se sentir inspirado por este homem que buscou com a vida e os meios de anunciar o evangelho de Jesus, nosso Salvador.

Quando Dom Mário chega ao Brasil, estão efervescendo os frutos e resultados do Concílio Vaticano II (1962 a 1965). Os padres conciliares publicam em 04 de dezembro de 1963 o Inter Mirifica, sobre a comunicação social, segundo documento conciliar aprovado, sendo a primeira vez na história que o Concílio fazia um documento sobre a comunicação. O Inter Mirifica é um decreto, fala da Igreja e o uso dos meios de comunicação:

Além disso, o Inter Mirifica também apresenta a primeira orientação geral da Igreja para o clero e para os leigos sobre o emprego dos meios de comunicação social. Havia agora uma posição oficial da Igreja sobre o assunto” (PUNTEL, JOANA T, 2012, P. 11).

Entre as várias iniciativas propostos pelo Decreto Inter Mirifica está a criação do Dia Mundial das Comunicações Socais (DMCS), sendo o primeiro Dia Mundial celebrado em 7 de maio de 1967, com o tema “I Dia Mundial das Comunicações Sociais”. Desde então, os Papas escrevem uma mensagem de esperança e motivação para celebrar este dia especial:

Para reforçar o variado apostolado da Igreja por intermédio dos meios de comunicação social celebre-se anualmente, nas dioceses do mundo inteiro, um dia dedicado a ensinar aos fiéis seus deveres no que diz respeito aos meios de comunicação, a se orar pela causa e a recolher frutos para as iniciativas da Igreja nesse setor, segundo as necessidades do mundo católico. (nº. 18).

Muitas de suas obras até hoje persistem como as Rádios e a Gráfica, sua semente de comunicar foi plantada e como toda boa comunicação ela ecoa no coração da Diocese de Paulo Afonso.

Concluo este breve artigo com uma pequena poesia (13/11/2023) do irmão no presbitério Pe. José Ramalho, Pároco da Paróquia São Pedro em Novo Triunfo, por ocasião da Semana Cultural Dom Mário Zanetta e no dia do translado dos restos mortais de Dom Mário e Pe. Lourenço Tori do Cemitério à Catedral Nossa Senhora de Fátima para a Capela da Ressureição, sobre “Dom Mário Zanetta: o comunicador da caridade”.

O óleo da minha alma, acende a fé da verdade, Dom Mário semeou, a semente da caridade, Santa Dulce testemunhou, pondo em prática esta verdade.

Pela fé e esperança, ele foi comunicação, Pois crendo na caridade, Viveu em sua missão, Dando a sua vida, Nestas terras do sertão.”

Muitos destes projetos eram patrocinados com recursos oriundos do estrangeiro, conseguidos por Dom Mário, seus amigos e familiares. Hoje, mais que manter suas obras lá atras iniciadas, precisamos nos questionar sobre qual a comunicação que queremos para Igreja hoje? Quais caminhos os novos tempos nos aponta em relação a comunicação? Qual a comunicação a Diocese de Paulo Afonso hoje deseja trilhar? Qual seu projeto em comunicação?

O Papa Francisco expressa em sua mensagem para o 57 Dia Mundial das Comunicações Sociais, datada em 24 de janeiro de 2023, o seu sonho de uma comunicação eclesial:

Na Igreja, temos urgente necessidade de uma comunicação que inflame os corações, seja bálsamo nas férias e ilumine o caminho dos irmãos e irmãs. Sonho com uma comunicação eclesial que saiba deixar-se guiar pelo Espírito Santo, gentil e, ao mesmo tempo, profética, capaz de encontrar novas formas e modalidades para o anúncio maravilhoso que é chamada a proclamar no terceiro milênio”. 

Na Igreja, temos urgente necessidade de uma comunicação que inflame os corações, seja bálsamo nas férias e ilumine o caminho dos irmãos e irmãs. Sonho com uma comunicação eclesial que saiba deixar-se guiar pelo Espírito Santo, gentil e, ao mesmo tempo, profética, capaz de encontrar novas formas e modalidades para o anúncio maravilhoso que é chamada a proclamar no terceiro milênio”.

 

Hoje, a comunicação nos interpela a uma comunicação instantânea, veloz, com o avanço da informática e internet; mudou-se o modo de interagir e comunicar. Novos tempos, novos modos de comunicar, sendo o Evangelho chamado a anunciar a Boa Nova do Reino nestes novos modos de comunicar.

Jesus, Comunicador do Pai, que inspirou Dom Mário continue a inspirar novos comunicadores para os novos tempos, ousados e destemidos, pois proclamar o Evangelho é declará-lo sobre todos os telhados.

 

Pe. José Ronnes dos Santos Santana
Pároco da Paróquia Sagrada Família, Paulo Afonso, Bahia
Agente da Pastoral da Comunicação Diocesana (Pascom)
Contato: ronnes.santana@gmail.com
Paulo Afonso, BA, quinta-feira, 23 de novembro de 2023.

 

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